Escrevendo uma carta

MANDAR NOTÍCIAS COMO ANTIGAMENTE

Não está tão longe assim a época em que a gente enviava notícias e esperava longos dias pra outra pessoa ler. E mais uma “eternidade” pra receber a resposta. Você ou seu pai ou sua mãe podem ser, assim como eu, da galera daqueles que namoraram através de cartas. Assim como casais que moravam em diferentes cidades. E só se encontravam nos finais de semana. Ou separados por oceanos, residindo em países distantes, demorando meses pra se ver. A carta virava um afago, um alívio enquanto o encontro não acontecia. Isso nos tempos românticos dos anos 70 e 80. O elegante hábito da troca de cartas envolvia, logicamente, a escolha de um bom papel e envelope, desenhos, colagens e enfeites, gotas de perfume ou de um tempero curtido pelo casal, uso de uma caneta especial. E incluía uma demorada caminhada até Os Correios durante a qual, cheios de ansiedade, íamos tentando nos lembrar da mensagem contida. E já imaginando o que a amada ou o amado iria pensar ao abrir o envelope e ler a nossa carta.

Em 1977, uma canção propôs o envio de uma carta de amor por meio de um canal aéreo diferente, contando com a ajuda de um pássaro. Lembra qual era? A composição, de Antonio Pires, Osmar Macedo e Adolpho Antonio Nascimento, foi o destaque do disco Meninas do Brasil de Moraes Moreira. Era “Pombo Correio”, que começava com um pedido aflito: “Pombo correio, voa depressa. E essa carta leva para o meu amor. Leva no bico que eu aqui fico esperando. Pela resposta que é pra saber. Se ela ainda gosta de mim.”

Escrevendo uma cartaHavia mais um disputado canal pra mensagens, de modo falado: o telefone fixo, com a linha residencial que atendia as demandas namorosas e rotineiras de toda a família. Se uma pessoa estivesse na rua ou viajando, tinha que comprar fichas e enfrentar filas se quisesse ligar de um telefone público pra alguém. Então era tirar o telefone do gancho do equipamento chamado orelhão, inserir as fichas num pequeno reservatório em cima e discar o número. Conforme a conversa ia andando, as fichas iam caindo. Cada ficha de ligação local durava 3 minutos e a de longa distância durava 18 min.

Na música criada por Chico Buarque em parceria com Roberto Menescal, que virou trilha sonora do filme homônimo de Cacá Diegues, o personagem criado por Chico usa o orelhão para mandar notícias pros seus familiares. Foi em Bye bye Brasil” de 1979. “Oi coração. Não dá prá falar muito não. Espera passar o avião. Assim que o inverno passar. Eu acho que vou te buscar. Aqui tá fazendo calor. Deu pane no ventilador… Bye, bye Brasil. A última ficha caiu. Eu penso em vocês night’n day”.

Chico Buarque também usou outra forma original para enviar notícias em versos musicais. A ocasião desta vez ocorreu em “Meu caro amigo” (Chico Buarque e Francis Hime), de 1980, com o auxílio de um gravador cassete. ”Meu caro amigo, me perdoe, por favor. Se eu não lhe faço uma visita. Mas como agora apareceu um portador. Mando notícias nessa fita. Aqui na terra, tão jogando futebol. Tem muito samba, muito choro e rock’n’roll. Uns dias chove, noutros dias bate sol.”

Um antigo canal de mensagens, mais comumente utilizado para avisar candidatos aprovados em cursos e concursos ou para informar pendências financeiras, gerado pelo Telégrafo de Samuel Morse (1835), foi a inspiração pra Zeca Baleiro receber e criar sua bem-humorada mensagem com “Telegrama” a faixa mais tocada de seu álbum Pet Shop Mundo Cão, de 2002. “Eu tava triste, tristinho. Mais sem graça que a top-model magrela. Na passarela. Eu tava só, sozinho! Mais solitário que um paulistano. Que um canastrão na hora que cai o pano. Tava mais bobo que banda de rock. Que um palhaço do circo Vostok. Mas ontem eu recebi um telegrama. Era você de Aracaju ou do Alabama. Dizendo: Nêgo, sinta-se feliz. Porque no mundo tem alguém que diz. Que muito te ama! Que tanto te ama!”.

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