RETRATOS, FOTOS E CÂMERAS NAS CANÇÕES
Como negar a importância das fotos em nossas vidas? Aparecendo em retratos 3×4 de documentos. Ou ampliadas, em formatos maiores, registrando os mais especiais momentos de eventos familiares, com amigos, na escola, artísticos, profissionais e tantos outros. Por falar em retrato, recordo de dois estúdios fotográficos da minha infância em Botucatu: o Foto Rocha e o Caricati.
Depois de vestidos com roupas novas, meus pais levavam minhas irmãs e eu até aqueles cenários especiais para tirar as fotos de ocasião. Algumas sessões de clics viraram ampliações, emolduradas com passepartouts. E ficaram, por anos, penduradas como quadros de arte nas paredes da casa paterna de Botucatu. Outras centenas de fotos continuam guardadas em álbuns, preservando a memória familiar, desde os tempos de nossos avós e bisavós. Algumas selecionadas continuam destacadas nos porta-retratos.
Papai foi o fotógrafo da família por um bom tempo. Nos anos 60 usava uma Walzflex, com visor embaixo. A partir dos anos 70 optou por máquinas compactas da Sony. Eu comecei a fazer fotos “pensadas”, quando entrei no Curso de Publicidade e Propaganda, em 72. Minha primeira e única câmera sofisticada, uma Cannon AE1 Program, comprei nos anos 80 e usei até o ano 2005. Ela foi muito útil para fotografar a paisagem urbana e embasar minha dissertação de mestrado.
Em viagem pro Canadá, em 2010, meu filho trouxe nossa primeira máquina digital, uma Cannon Power Shot SX 420. Mas, logo a seguir, passamos a usar os celulares como nossas câmeras oficiais. Assim as fotos familiares mais recentes estão guardadas em álbuns de drives de nossos laptops e avulsos. E nas memórias quase que infinitas de nossos celulares.
Nesta crônica um foco nas presenças de câmeras, retratos e fotografias nas lentes de conhecidos versos musicais. Começando por retratos.
Lá em 1956, Adoniran Barbosa cansou de avisar a amada “Iracema” para ter cuidado ao atravessar as ruas da cidade. E no final guardou apenas a saudade e uma revelação. “Iracema, eu nunca mais que te vi. Iracema meu grande amor foi embora… De lembranças guardo somente suas meias e seus sapatos. Iracema, eu perdi o seu retrato.”
“Devolva-me”, composta em 1966 por Lilian Knapp e Renato Barros, foi o primeiro sucesso da dupla Leno e Lilian. E trouxe um pedido de uma garota que, após o final de um relacionamento, quer de volta uma coisa bem pessoal. “O retrato que eu te dei. Se ainda tens, não sei. Mas se tiver, devolva-me”.
“Retrato em Branco e Preto”, presente no álbum Chico Buarque, Vol.3, de 1968, é a primeira parceria de Chico Buarque e Tom Jobin. Nos versos, Chico relata a desilusão do personagem, então lembrada por fotos e sonetos em branco e preto. “O que é que eu posso contra o encanto. Desse amor que eu nego tanto… Volta sempre a enfeitiçar. Com seus mesmos tristes velhos fatos. Que num álbum de retratos. Eu teimo em colecionar… Vou colecionar mais um soneto. Outro retrato em branco e preto. A maltratar meu coração”.
A citação de fotografias é intensa. No brilhante disco Elis & Tom, de 1974, uma canção de Tom Jobin descreve uma “Fotografia”. “Eu, você, nós dois. Aqui nesse terraço à beira mar. O sol já vai caindo e o seu olhar parece acompanhar a cor do mar. “
Trilha sonora da mini-série de Giberto Braga, de 1986, “Anos Dourados” traz outra música de Tom Jobim, com letra de Chico Buarque sob medida para as recordações da personagem Maria de Lourdes, vivida por Malu Mader.” Parece que dizes. Te amo, Maria. Na fotografia. Estamos felizes”.
Na “Fotografia”, de Leo Jaime e Leoni de 1993, o protagonista torce para que a sua vida vá além de um evento fotográfico, parado no tempo. “Quando o dia não passar de um retrato. Colorindo de saudade o meu quarto. Só aí vou ter certeza de fato. Eu fui feliz. E o que vai ficar na fotografia. São os laços invisíveis que havia. As cores, figuras, motivos. O sol passando sobre os amigos.”
E fechando com câmeras. Aqui aparecem duas grandes marcas, cada uma com seu formato e sua fase. Em 1958, Tom Jobim e Newton Mendonça compuseram uma canção que ironizava cantores da época. Só não imaginavam que, no ano seguinte, “Desafinado” casaria perfeitamente com a voz diferente de um novo cantor, que cantava baixinho e tocava o violão de modo descompassado. João Gilberto adotou a canção que ajudou a consagrar o seu LP Chega de Saudade e empurrar pra frente o novo ritmo brasileiro. “Se você disser que eu desafino, amor. Saiba que isto em mim provoca imensa dor…Fotografei você na minha Rolleiflex. Revelou-se a sua enorme ingratidão… Isso é bossa nova. Isso é muito natural.”
Em 1973, em seu álbum solo There Goes Rhymin´Simon, a principal canção, é “Kodacrhome”, um merchan direto ao filme colorido da Kodak que, associado ao uso de uma câmera Nikon, ,são “responsáveis” pelos belos registros de dias ensolarados, com cores brilhantes. “Kodachrome. They give us those nice bright colors. Give us the greens of summers. Makes you think all the world’s a sunny day, oh yeah. I got a Nikon camera. I love to take a photograph.”
CRÉDITOS
NOTA 1- Esta crônica escrita complementa o podcast do Episódio 119 “Retratos, fotos e câmeras nas canções” do Canal Semônica, produzido pelo podcastmais.com.br.
NOTA 2- Pesquisa histórica, pesquisa musical, texto, roteiro e voz no podcast por Nando Cury
NOTA 3- Imagens de estúdios fotográficos são apenas referências e não registros históricos
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